É só Pedir para Receber?
Daniel Lima
Nascemos com um foco de suprir o que nos falta. O bebê, ao chorar por fome, não está preocupado (nem poderia) se o momento é adequado ou não para a mãe. Ele ou ela sente fome – alguns dizem que bebês sentem dor quando estão com fome, e assim, querem ter seu problema resolvido. Ao crescer, tomamos consciência dos outros ao nosso redor, mas continuamos preocupados em suprir nossas necessidades. A criança logo descobre que seu choro ou seu sorriso tem impacto sobre as pessoas ao seu redor. Assim, ele ou ela passam a utilizar tudo de que dispõem para obter o que querem. Como adultos, esse sistema se torna apenas mais complexo e sofisticado. Usamos dinheiro, manipulação, pedidos, súplicas e todo tipo de estratégia para obter o que queremos.
Imagine o que ocorre na mente do ser humano, conforme descrito acima, quando ele ou ela lê a passagem de Lucas 11.9-10:
“Por isso, eu digo: Peçam, e será dado a vocês; busquem e vocês encontrarão; batam, e a porta será aberta a vocês. Pois todo aquele que pede recebe; o que busca encontra; e, àquele que bate, a porta será aberta. Qual pai, do meio de vocês, se o filho pedir um peixe, lhe dará, em lugar disso, uma cobra? Ou, se pedir um ovo, lhe dará um escorpião? Portanto, se vocês, apesar de serem maus, sabem dar boas coisas aos seus filhos, quanto mais o Pai que está nos céus dará o Espírito Santo aos que lhe pedirem!”
É natural que sua mente, ainda natural, comece a pensar: “Se isso é verdade, vou passar a seguir a Jesus para ganhar o que eu quero!”. Essa compreensão equivocada do sentido da passagem tem sido usada e abusada por líderes evangélicos sem escrúpulos ou sem entendimento da Palavra. Veja bem, o erro não está na passagem, mas em como essa promessa é compreendida por uma mente carnal. A promessa é expressa em resposta a três ações: pedir, buscar e bater. A primeira ação é pedir. Esse verbo indica o ato de expressar uma necessidade percebida, reconhecendo que a pessoa a quem se pede tem poder ou condições de atender essa necessidade. Pedir não é o mesmo que barganhar ou mesmo exigir. Se eu tenho um contrato com alguém, é natural que eu expresse minha expectativa de que a outra parte cumpra seu acordo, faça conforme prometido no contrato. Certamente não é assim nossa relação com Deus.
Nossa relação com Deus é baseada inteiramente na graça, do início ao seu glorioso final. Somos salvos pela graça (Efésios 2.8-9), crescemos pela graça (1Coríntios 15.10), somos levados ao céu por toda eternidade pela graça de Deus (Romanos 6.23). O sentido de graça é “favor não merecido”. A atitude fundamental de quem pede inclui reconhecer que toda dádiva que recebemos é fruto dessa graça.
Nossa relação com Deus é baseada inteiramente na graça, do início ao seu glorioso final.
A segunda ação é buscar. Buscar é um verbo de ação, ou seja, exige que aquele que busca saia de seu lugar e examine ativamente na procura daquilo que almeja. Não posso afirmar que busco sem fazer nenhum esforço para encontrar. Buscar sempre inclui dedicar tempo, esforço ou mesmo recursos. Preciso deixar algo de lado para buscar, especialmente a Deus.
Buscar, em certo sentido, inclui uma atitude de valorizar mais o que se almeja do que aquilo que já se tem. Em outras palavras, se estou satisfeito com minha vida como está, não vou buscar nada. Paulo expressa isso muito bem ao afirmar que toda sua herança judaica, suas realizações como fariseu, eram para ele como lixo comparado à sua busca por Jesus (Filipenses 3.7-11).
Em terceiro lugar, temos a ação de bater. Bater é uma ação concreta de, tendo encontrado o que se busca, fazer um esforço para acessar esse objeto da busca. Incluída também nessa ação há uma atitude de submissão. Aquele que bate pressupõe que alguém tem autoridade e condições para abrir. Mais do que isso, esse alguém pode ou não abrir! Assim, aquele que bate está em uma postura de pedinte, na expectativa de que aquele que pode abrir o faça em seu favor.
É muito curioso como, com frequência, Deus pede de quem o busca um passo de fé antes mesmo de conceder o que se pede.
É muito curioso como, com frequência, Deus pede de quem o busca um passo de fé antes mesmo de conceder o que se pede. É como um teste, onde somente nós não sabemos o resultado. Um exemplo disso é quando Jesus cura a mão do homem no sábado na sinagoga. No relato registrado em Lucas 6.6-11, Jesus chama para o meio da sinagoga o homem com a mão atrofiada. Ao invés de apenas curá-lo, ele pede que o homem estenda a mão, expondo assim sua deficiência. Esse é o momento em que o homem decide se vai ou não “bater”, ou seja, tendo reconhecido sua necessidade, ele dá um passo na expectativa de que Jesus pode fazer algo a respeito.
Mesmo nessa reflexão breve, fica evidente que o pedir que Jesus está alegando não é uma barganha baseada em algum acordo. É uma atitude humilde, que reconhece que o Senhor tem o melhor para nós e que dá passos em direção a Deus. Um contraste interessante é o texto de Tiago 4.2-3, onde Tiago amplia a questão do pedir destacando a motivação. Minha oração por mim e por você é que, ao orar e pedir, o Senhor seja louvado em nossa atitude.
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